Momentos Mágicos – dia 23 de maio de 2018
Vivemos num mundo onde temos que nos esconder para fazer amor, enquanto a violência é praticada à luz do dia. John Lennon
O amor às vezes se esconde em gestos inesperados, em lugares
improváveis.
Hoje eu fui à biblioteca pública,
um lugar onde muitos momentos mágicos ocorrem, reduto de conhecimento e de
elevação.
Enquanto procurava um livro que
me interessasse, ouvi gritos de uma mulher que vinham de fora.
Percebi que outras pessoas
buscavam as janelas para ver o que ocorria.
Uma mulher gritava com um homem caído
no chão, tentando levantá-lo sem sucesso.
Não era possível ouvir o que
diziam, mas, em certo momento ela passou a agredi-lo no chão.
Depois, conseguiu erguê-lo, mas,
na sequencia, após uma troca de insultos, o esbofeteou fazendo-o cair mais uma
vez inerte no chão.
Já iniciava a noite e estava
muito frio: o homem estava com uma camisa fina e aberta.
Um rapaz aproximou-se do homem no
chão e a mulher veio ter com ele.
Aos berros, a mulher dizia que aquele homem
estava a destruir sua vida. Usuário de drogas, esvaziava os mantimentos e
roubava os poucos recursos da família. Informou também que estava sendo
ameaçada por traficantes por causa daquele homem.
Momentos mágicos não são tão
somente momentos felizes, mas, aqueles que me levam à reflexões.
Ao analisar os fatos, percebi que
assim como eu, muitos se indignaram com a atitude violente daquela mulher.
Após o seu relato, que iniciou
com gritos e terminou num pranto, a situação se inverteu, e passamos a ter pena
da pobre mulher.
Ali naquele lugar se desenrolava
uma história real, que ocorre com frequência em muitos lugares da cidade e do
mundo.
A tragédia de famílias que se
envolvem com a presença de um usuário, o que equivale a uma doença familiar,
pois, todos se prejudicam, sofrem e morrem aos poucos de forma involuntariamente
solidária.
Entretanto, existem sentimentos
subliminares que escapam ao olhar desatento.
Aquela mulher, vítima daquele homem
doente, poderia abandoná-lo naquele lugar. Ali, com a chegada da noite e a
queda progressiva da temperatura, ele poderia morrer, ou adoecer e ser levado a
algum abrigo ou hospital público.
Mas não foi isso que ela fez:
preferiu agredi-lo, ofendê-lo, mas, fazê-lo levantar-se para leva-lo para sua
casa.
Atrás de uma cena de violência,
um coração ferido, uma mulher que implora pelo retorno de seu parceiro, apesar
de todo o sofrimento e exposição pública.
Enquanto eu e outros cidadãos
buscavam na biblioteca leituras que nos confortasse e nos trouxesse sentido
para nossas vidas, do lado de fora a vida daquele casal se apresentava qual
peça teatral, mostrando um homem que talvez buscasse o mesmo, mas por caminhos
errados e uma mulher que nos ensinava que o amor se manifesta de diversas
maneiras.
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