HISTÓRIAS URBANAS – episódio 2


No dia dois de abril de 2015, fomos procurados por uma senhora que nos trouxe uma situação caótica em que vivia sua sogra, cujo nome convenciono aqui chamar de “Dna. Maria B”, para preservar a sua identidade.

Estive, então, no local e o que vi me deixou perplexo. Tratava-se de uma pessoa com um sério problema de queimadura em uma de suas pernas que a impedia de andar. Havia uma ferida aberta e purgante, que exalava um odor pútrido e impregnava o ambiente. A habitação consistia de um pequeno cômodo de madeira, sem banheiro: apenas suficiente para acomodar uma cama, uma cadeira, uma pia e um fogão.

Essa precária construção encontrava-se em um terreno elevado, cercado de mato crescido, configurando uma cena de total abandono.



Era uma sexta-feira e saí dali abalado. Cheguei em casa e chorei copiosamente. Apesar de minha experiência de décadas com situações semelhantes, não consigo me “acostumar” com histórias assim. Em minha mente vem a questão do abandono que certas pessoas enfrentam, levando uma vida comparável a de um animal confinado. Que triste destino para aquela pessoa, aquele ser humano que, independentemente de sua história pessoal, vivia de forma sub-humana.

Tendo uma viagem agendada para a semana seguinte, passei o caso para a assistente social, que foi ao local na semana seguinte. Assim como eu, sensibilizou-se com a situação e começou a mover o que chamamos de “teia social”: foram acionados o Centro de Referência de Assistência Social - CRAS e o Posto de Saúde – PA, que realizaram visitas e iniciaram um movimento de transformação na situação daquela senhora.

A “Dna. Maria B”  está sendo medicada. Alcoólica, conseguiu parar de beber, por iniciativa própria, e hoje passa o tempo com o tricô. Um de seus filhos decidiu ajudar: construiu um banheiro e limpou o local, que hoje tem até mesmo uma cerca e portão.

Ainda existe um longo caminho para que a vida dessa senhora possa chegar a um nível que possamos considerar de dignidade humana, mas, certamente, esse caminho já começa a ser percorrido.

A história começou a mudar com a iniciativa de sua nora, que buscou ajuda e catalisou um processo que desejamos que seja irreversível. Parte do sucesso deve-se à percepção de “Dna. Maria B” sobre a preocupação de algumas pessoas com sua saúde e conforto, o que a fez buscar uma melhor qualidade de vida. O abandono que a levou a situação caótica em que se encontrava teve fim, enfim.

Em 9 de junho de 2015 estivemos no local e fizemos a foto que mostra parte dessas mudanças. Mudanças significativas, resultante de pequenas -  mas fundamentais - atitudes.




De volta ao local em 12 de setembro de 2017 a transformação foi mais impactante.







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