MÚSICA

fonte: http://desciclopédia.org/wiki/Taira_no_Atsumori



Certa noite de luar, Hiromasa passeava tocando flauta nos arredores do portão meridional do Palácio Imperial quando, ao passar pelo alto portal de cumeeira dupla, ouviu alguém sobre o portal acompanhando-o com outra flauta. Conversou com o desconhecido, permutaram-se os instrumentos e passaram o resto da noite em animado dueto. Mais tarde, contava a lenda, soube-se que o desconhecido era o diabo que assumira a forma humana. Dizia-se que a música tinha o poder de comover até mesmo o diabo.(Pag, 100 e 101).*


o momento histórico em que as informações podem ser acessadas com uma facilidade nunca antes verificada em nossa história humana.

Apesar disso, a comunicação ganha uma importância imprevista, tornando a imagem algo a se preservar exageradamente.

Uma manifestação, uma ocorrência, uma imagem divulgada, pode se multiplicar e correr o planeta. Isso significa que pode-se tornar repentinamente uma celebridade ou alvo de chacota mundial, podendo despertar o amor ou o ódio em proporções incontroláveis.

A imagem define o poder ou o fracasso.

É verdade que a velocidade também entra nessa fórmula e, apesar da ameaça da imagem, a volatilidade de um fato torna qualquer evento um simples momento fugaz, que será esquecido pouco tempo após a sua exposição.

Mas, a comunicação traz responsabilidades, classificam os seus emissores, levantam sua importância ou os condenam ao ostracismo e, em alguns casos, à uma situação que se situa próxima a morte social.

Comunicar um pensamento pode lhe render uma classificação política, lhe colocar num polo entre poucas opções, num extremo de uma ordem idealizada e bipolar.

Ao mesmo tempo em que se comunica muito, as diversidades são desprezadas. Os movimentos reivindicadores se multiplicam. O feminismo, a questão racial, das opções sexuais, até mesmo a liberdade de escolha de religião, ou do ateísmo, são lutas emergentes em ascensão.

As informações não parecem alcançar o conhecimento e a ignorância, aliada a infantilidade de uma geração hedonista, assume formas e contornos hostis.

Creio que não é fácil a comunicação na contemporaneidade. Toda a cautela é prudente. 

Assim como diz a lenda que menciono no início deste texto, talvez a música seja o último reduto para a comunicação. Talvez seja a música, essa manifestação humana e presente em todas as civilizações, em todos os tempos, a linguagem de Deus, a mensagem capaz de unir, de apaziguar os espíritos e de nos sensibilizar.

Ainda que existam músicas que parecem não nos trazer nada além do reforço das mazelas humanas, ainda existe a possibilidade de desprezar as letras, privilegiando as melodias.

Talvez seja essa a fórmula perfeita: a melodia sem letras, a música pura, a linguagem de Deus.



*YOSHIKAWA, Eiji, MUSASHI, editora Estação Liberdade, 1999

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