O PODER DE MUDANÇA PODE ESTAR NO SEU BOLSO?

"A evolução de uma sociedade, inclusive a evolução de seu sistema econômico, está intimamente ligada a mudanças no sistema de valores que serve de base a todas as suas manifestações. Os valores que inspiram a vida de uma sociedade determinarão sua visão de mundo, assim como as instituições religiosas, os empreendimentos científicos e a tecnologia, além das ações políticas e econômicas que a caracterizam. Uma vez expresso e codificado o conjunto de valores e metas, ele constituirá a estrutura das percepções, intuições e opções da sociedade para que haja inovação e adaptação social. À medida que o sistema de valores culturais muda - frequentemente em resposta a desafios ambientais - , surgem novos padrões de evolução cultural." (CAPRA, 1982, p. 182)

A partir de certo momento em minha vida, passei a ser um questionador, um "desajustado", contra dogmas assumidos irrefletidamente e repetidos como "clichês" sem sentido.
Questões tidas como verdades incontestáveis e que me aparentavam ser uma face hipócrita da cultura humana,
Em algum período vi no capitalismo a culpa de todas as desgraças,
O dinheiro atribuído às coisas era cruel, injusto e incoerente.
Mas, percebi com o tempo, que o valor monetário das coisas é resultante de certas condições: a primeira é a exclusividade. Se algo não pode ser encontrado com facilidade, torna-se caro. Outro fator é a dependência. Se nos sentimos dependentes de algo, aceitamos pagar por isso, preços elevados, exigindo-nos grandes esforços. Ainda existe o desejo, que torna coisas aparentemente sem sentido, em produtos caros e quase inacessíveis.
Pensando nessas condições, podemos inferir que existem situações que nos tornam dependentes de fato, por estarem ligadas às necessidades básicas para a sobrevivência, como a alimentação, a moradia, a saúde e a segurança. 

Mas existem outras necessidades, essas relacionadas a valores atribuídos pela cultura em que estamos inseridos, as quais criam as percepções para a exclusividade e para os desejos.

É nesse ponto que me volto para o texto citado.
O autor menciona que o sistema de valores culturais estaria na raiz das manifestações e comportamentos sociais.
Daí percebo uma ligação de uma observação que eu intui há algum tempo, sobre uma possível ligação entre aquilo que valorizamos e os resultados disso nas mazelas de nossa sociedade.
Se nossa sociedade valoriza produtos importados, por exemplo, fica claro que nossa produção interna perderá valor, força e se extinguirá.
Da mesma forma, quando investimos parte importante de nossos recursos na compra, por exemplo, de um automóvel, abrindo mão de investimentos em nossa educação, é de se supor que os automóveis sejam cada vez mais caros, enquanto a educação será desvalorizada e perderá sua qualidade.
É claro que não podemos pensar de forma individual, mas, a soma de comportamentos semelhantes pode ter resultados devastadores, criando desemprego em certos setores, sobretudo aqueles ligados a produtos e serviços desvalorizados culturalmente, mitas vezes fonte de renda de muitas famílias.
Somos, portanto, responsáveis pela sociedade que criamos. 
Isso também significa que temos nas mãos o poder de mudar, através de nossas decisões de compra.
Imagine se a sociedade passasse a rejeitar produtos de empresas que não prezam pela sustentabilidade e favor daquelas que respeitam esse quesito em seus meios de produção e comercialização?
Imagine se, ao invés de investirmos em automóveis, celulares sofisticados ou roupas de grife, procurássemos investir em educação, turismo e em projetos socioambientais?
É verdade que somos bombardeados com informações carregadas de intencionalidades voltadas para a construção de valores culturais que não passam pela avaliação racional, mas, apenas se valem do apelo emocional.
Talvez possamos, portanto, mudar o mundo através de mudanças culturais que resultem em um novo comportamento de compra.
O mesmo vale para o planeta, sua preservação e melhoria na qualidade do meio ambiente.

O que podemos fazer?

A saída poderia ser, portanto, a adoção de medidas como as seguintes:

- usar a "razão" para a decisão do que consumir, mesmo que isso possa, num primeiro momento, nos tornar "estranhos" no ambiente em que vivemos;
- priorizar o investimentos naquilo que de fato necessitamos para uma vida digna, respeitando a sustentabilidade;
- buscar a educação de qualidade em lugar de aquisições pela vaidade;
- investir em setores que promovam o sustento de famílias, erradicando a pobreza, a miséria.

Ainda que tenhamos pouco a investir, o resultado de ações coletivas será capaz de mudar os valores culturais, o que promoverá uma mudança no mundo. O poder pode estar em nossas mãos, em nossos bolsos, em nossa conta bancária.

Uma revolução sem lutas, sem armas, mas, certamente vitoriosa, pois, a economia se alimenta de nossos recursos e precisamos ditar as regras, ao invés de viver numa situação como a presente, em que somos guiados por ela.





CAPRA Fritjof - "O Ponto de Mutação", edição 1982, p.182, Editora Cultrix.

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