HISTÓRIAS URBANAS - episódio 4

Existem histórias que não podem cair no esquecimento, pela força que impacto que causam em nossas vidas.

Em algum momento nos anos 90, surgiu na cidade de Campinas, São Paulo, um novo tipo de empreendimento: uma locadora de livros. Sandra Almeida decidiu aproveitar um processo de demissão voluntária na IBM e tornar-se empresária, optando pelo negócio inovador. De tão inovador, foi objeto de reportagem na TV Campinas e, morando eu naquela cidade àquela época, tomei conhecimento, tornando-me sócio.

Além de sócio, tornei-me amigo de Sandra, uma pessoa muito sensível e carismática, que tornou a Locadora “Mania de Ler” um lugar de leitura, encontros e bate-papo.

Por causa do sucesso do livro “A insustentável leveza do ser”, passei a ler Milan Kundera, seu autor. Me impressiona a sua capacidade de construir personagens interessantes, aprofundando em suas personalidades e ideologias, tornando a trama não tão importante como o desempenho de seus atores.
A última vez que conversei com Sandra, pedi a ela um livro do autor, quando ela me disse que eu era o único leitor de Kundera na sua locadora, sendo que comprava seus livros apenas para que eu pudesse lê-los. Na ocasião dois fatos me chamaram à atenção: saber que era o único leitor de um autor tão interessante e saber que ela se dispôs a comprar seus livros apenas por amizade à minha pessoa, o que demonstra o carinho que tinha por mim.

Mudei-me para Joinville em 2010 e, desde então, nunca mais falei com a Sandra, assim como não mais li os livros de Kundera.

Passei a frequentar a biblioteca pública de Joinville e, no início deste ano de 2016, em um dia em que cheguei à biblioteca, instantes antes que se fechasse, precisando pedir um livro rapidamente, repentinamente surgiu à minha mente o nome de Milan Kundera. Pedi à bibliotecária e ela me mostrou os títulos disponíveis. Não houve tempo de pensar muito e tudo ocorreu meio que por impulso.

Ao chegar em casa, abri meus e-mails e, um deles era da filha de Sandra, comunicando seu falecimento.

Não bastasse a grande coincidência, se é que essas existem, de ter me lembrando do autor exatamente no momento da morte de Sandra, o título do livro contribuiu para que eu me convencesse da situação sobrenatural dos fatos – o nome do livro era  “A imortalidade”.

Teria Sandra, em seu momento de morte, enviado um sinal para mim, uma despedida, ou teria eu sentido sua morte, por meios inexplicáveis pela ciência atual?

Não saberia dizer, a não ser que me convenço cada vez mais, que sabemos muito pouco sobre a vida, a morte e tudo o que nos cerca.



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