PALESTRAS VAZIAS, MENTES RASAS

 


Somos uma sociedade violenta e iludida, acreditando – ou se fazendo acreditar – em fantasias e performando avatares, nos enganando e nos deixando enganar, terceirizando o pensamento para aproveitadores que nos usam e nos iludem.



Participei na semana passada de um evento em um espaço empresarial.

O tema foi o dia da “criatividade” e com diversos palestrantes trazendo diferentes abordagens.

Fui como ouvinte porque uma das palestras abordava o tema da criatividade aplicada à acessibilidade.

Assisti, entretanto, outras duas palestras.

A palestra sobre acessibilidade foi, de fato, interessante, posto que a palestrante trouxe informações novas sobre o tema.

As demais me decepcionaram grandemente.

Os temas foram trazidos sem qualquer aprofundamento.

Os palestrantes apresentaram conceitos rasos, pinçados em buscas no Google e citando pensadores sem o menor cuidado na contextualização de seus pensamentos. Pior: interpretações rápidas e descuidadas sobre citações desses pensadores, o que me deixou a impressão de que o apresentador tinha uma intenção e usou frases e pensamentos como reforço, distorcendo em alguns momentos o que foi pesquisado de maneira a favorecer pontos de vista discutíveis.

Apresentações feitas em Power point com textos que eram lidos exatamente como se apresentavam nos slides.

O público não chegava a ocupar 30% do espaço do auditório.

Quanto desperdício de tempo e recursos!

Penso que, montar apresentações baseadas em pesquisas no Google sem que se tragam informações novas ou contrapontos sobre pensadores é de uma infantilidade absurda.

Mas, o pior: parece ser um padrão em muitos eventos.

A sensação que me dá é de que tudo se resume em vaidade e mentiras.

Os palestrantes não se preparam devidamente – o que para mim é um desrespeito com o público – além de não colocarem novas reflexões sobre o tema e, muito menos, provocar a curiosidade e análise crítica dos ouvintes.

O público não se importa, participa com constantes olhadelas nos seus celulares e depois aplaudem como parte de um teatro orquestrado como etiqueta social.

Saem do evento sem conhecimento, sem interesse ou curiosidade sobre os temas abordados.

Me parece um espetáculo construído para que palestrantes despreparados possam alimentar seus egos. A plateia também deseja apenas registrar presença e incluir o evento em seus currículos, para uso como argumento em suas oportunidades profissionais.

Será que estamos perdendo a noção da realidade, vivendo de manifestações teatrais e nos enganando constantemente?

Será essa uma das causas ou efeitos de uma sociedade que se embrutece e se contenta com o supérfluo? E que se sente vazia e frustrada, em busca de uma felicidade baseada em fantasias?

Nos anos 90, as empresas abraçaram o discurso da “Qualidade Total” e surgiram gurus e palestrantes que exploraram o tema.

Eu me empolguei com os conceitos e cheguei a fazer parte desse time de divulgadores.

Hoje percebo que aqueles conceitos tem sido remodelados, adotado novos nomes – de preferência na língua inglesa – e vendidos como pacotes por aí afora.

As empresas não os aplicam, apenas jogam seus funcionários numa ilusão, enquanto continuam a proceder, em sua maior parte, de maneira a obter maiores lucros pelos caminhos tradicionais, que ampliam a desigualdade social e mascaram ações predatórias com eventos politicamente corretos.

Somos uma sociedade violenta e iludida, acreditando – ou se fazendo acreditar – em fantasias e performando avatares, nos enganando e nos deixando enganar, terceirizando o pensamento para aproveitadores que nos usam e nos iludem.

Quando será que iremos acordar?

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