A CORAGEM QUE NOS ESCAPA




Em mar tão aberto, é quase certeza que encontraremos perigos. Então, quando somos ameaçados pela tormenta da dor e do sofrimento, quando não somos mais que uma frágil embarcação agitada por forças superiores, existem pelo menos duas coisas diferentes a fazer: ou usar velas ainda mais potentes, lançar um rugido de gozo e arriscar heroicamente a vida, ou aplicar a sabedoria de uma longa existência, baixar as velas e  viver com energia reduzida, deixando-nos levar pelas correntes e  pelos ventos, sem lutar contra, até que nossas forças estejam  novamente disponíveis e as circunstâncias nos sejam mais favoráveis. O que de modo algum é próprio de quem tem coragem é a triste rebelião por meio do lamento e do ressentimento.

A POTÊNCIA segundo Nietzsche. Larrauri/Max -2000. Filosofia para      Leigos. Ciranda Cultural Editora e Distribuidora ltda. Edição 2011.


Para Nietzsche, a essência da coragem estaria em assumir uma das duas decisões: enfrentar ou recuar. A falta de coragem seria, portanto, o lamento ou o ressentimento, sinais de fraqueza, talvez uma tentativa de chamar à atenção o problema que não se deseja enfrentar, para que outros, por pena ou solidariedade, venham em socorro. A “não coragem” poderia ser entendida, em outra instância, como um comportamento egoísta, permissivo e doentio.

No livro Hindu Bhagavad Gita, encontramos passagens que remetem ao tema da coragem, mas acrescenta outro fator importante, como a ação pelo dever, sem esperar recompensas, a verdadeira luta, aquela que faz da coragem o instrumento para que se realizem proezas, mas, não para o lutador, senão para uma coletividade.

25. Assim como os ignorantes executam seus deveres com apego  aos  resultados, igualmente os que são sábios também cumprem    seu dever, sem desejar nada em troca, apenas com o propósito de   conduzir as pessoas para o caminho correto.
A etimologia da palavra "coragem": do Latim, CORATICUM, composto por COR, que representa aqui o "coração" e seguido por ATICUM, que representa "ação". Acreditava-se que a coragem se situava no coração, que o homem agia com coragem quando guiado por amor, mas o amor pelo coletivo, pelas causas nobres, Ser corajoso significava lutar pelo certo, pelo justo, sem pensar nos resultados, na glória da vitória ou na desgraça de uma derrota.

Essa coragem, que deveria estar entre os fundamentos da construção de nosso caráter, parece esvair-se, perder sentido, partir para o esquecimento. É importante ressaltar que um ato terrorista, por exemplo, nada tem a ver com coragem, pois que não busca o reto, o justo, mas o mal, o poder a qualquer custo e a ação fora da razão. Não nasce do coração.

A coragem não está dissociada da razão: ao contrário, prescinde de uma avaliação sobre o caminho que se apresenta, sob a ótica da correção, da justiça e do amor. Amor esse que se encontra no mesmo berço da coragem: o coração humano,



Comments

Unknown said…
Como sempre João, perfeito em suas palavras! Excelente texto!

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