Qual o limite para a alienação?

Ao observarmos o comportamento de muitos, percebemos a sintonia no que se refere às aparências físicas, de vestimenta e de hábitos que vão desde a forma de caminhar até a linguagem em uso. Aqueles que estão de fora desse comportamento padronizado, são tidos como excêntricos ou inferiores, dependendo do grau de importância que a sociedade lhes confere. A inclusão nesse grupo padrão, formatado pelos interesses econômicos de momento, exige o consumo de bens, alimentos e acesso a locais muitas vezes excludentes para a maior parte da população.

Assim, existe um grupo considerável da população que se sente inferiorizada, frustrada e excluída, muitas vezes tendo acesso ao mínimo necessário para a vida, como moradia, alimentação e renda. Esse desconforto social gera tensões com efeitos sobre a segurança pública e a paz nas cidades.
É fato que a mídia tem grande influência na criação desse “padrão” de vida “ideal” e fundamentado no consumismo fútil. Mas será mesmo que essas pessoas estariam sendo enganadas, manipuladas? Teriam elas perdido o senso crítico?

Essa pergunta quem me fez foi minha orientadora no curso de mestrado que concluí em 2013 e me deixa ainda incomodado com as possíveis respostas. A pergunta sugere que algumas pessoas, mesmo cientes de que estão sendo conduzidas, se deixam levar para não se sentirem excêntricas ou inferiores.

Se isso for verdade, então duas questões se levantam:

1 – as pessoas nunca perdem o censo crítico, mas optam em deixarem ou não se levar;
2 – ao pensarmos na alienação, assumimos uma postura arrogante, sentindo-nos “superiores” a essas pessoas às quais julgamos “manipuladas”.

Mas, pensar assim seria também radicalizar, pois não posso imaginar que alguém sem acesso à educação de qualidade, tenha elementos para fazer julgamentos e escolhas adequadas.

Em minha vida profissional, atuo há muitos anos com projetos sociais e vivi em contato direto com famílias em comunidades pobres. Ainda hoje atuo com esse tipo de população. Antes, acreditava ser um benfeitor, alguém que levava soluções, atenção, cestas básicas, cursos, etc. Hoje já não me sinto mais assim, vejo que o que fiz teve mais retorno para o meu ego. Isso porque as pessoas nem sempre são tão inocentes e dependentes como julgamos, nós não somos os salvadores dessas pessoas como imaginamos e o que podemos fazer é tão pouco diante do caos social e emocional em que vivem, que se torna hilário nosso sentimento de benevolência. Seria eu também uma pessoa que se deixou manipular, desistindo de lutar pelos direitos coletivos e me consolando com atitudes pessoais de falsa benevolência?

Se o leitor espera respostas, sinto muito, mas não as tenho.
Apenas lanço essas questões para retratar minha angústia que se fundamenta na difícil – talvez impossível – avaliação sobre até onde pode ir a alienação popular e onde se encontra a fronteira com o meu ego.


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