ODS – ESG : expandindo conceitos...
Existe uma história que se
contava nos anos 90, sobre uma fábrica de sapatos que desejava atuar em um país
na África. Até onde sei, não se trata de história real, mas, uma “fábula” usada
para explicar a importância do estrategista na avaliação de mercados. Se algum leitor conhecer a versão correta, e
essa for diferente do que relato, por favor me corrija – minha memória me trai
constantemente.
Retomando à história, uma fábrica
de sapatos estudava ampliar seu mercado e vender em um certo país africano.
O CEO então, enviou seu assessor,
que viajou ao tal país e retornou com a seguinte informação: “ninguém usa
sapatos naquele país – melhor desistir, não vamos vender nada por lá.”
Não satisfeito com o retorno de
seu assessor, o CEO decidiu enviar ao país um vendedor. Após retornar de viagem,
o vendedor relatou: “ninguém usa sapatos naquele país: o mercado é
todo nosso, vamos vender sem concorrência.”
As respostas contraditórias
fizeram com que o CEO decidisse enviar um estrategista de marketing ao país.
Após retornar da viagem, o estrategista
relatou então: “Ninguém usa sapatos naquele país, portanto, o mercado será
de quem chegar primeiro. Entretanto, as pessoas não têm renda para comprar
sapatos, apesar de desejá-los. Descobri que vivem da colheita de abacaxis, mas,
têm dificuldades no escoamento da produção para exportação. Se ajudarmos a
solucionar esse problema, eles poderão exportar e, então, terão renda maior,
podendo, então, comprar nossos sapatos.”
Essa fábula mostra a
importância do planejamento estratégico, considerando a questão social como
parte importante - arrisco a dizer “crucial” - para o sucesso dos
empreendimentos.
Não à toa, as ações de ODS nas
empresas passaram a ser organizadas por um modelo que hoje se conhece como ESG
(Enviromental Social Governance), ampliando o espectro dos projetos com foco na
união da questão ambiental com o atendimento às necessidades sociais, cunhando
o termo muito utilizado nos dias de hoje: “socioambiental”.
Em reunião que participei no dia
de hoje com o grupo ODS de Santa Catarina, com a participação de empresas de
diversos segmentos no estado, ficou clara a necessidade de compartilhamento
de conhecimento e projetos com fins comuns ou complementares.
Sem esse trabalho colaborativo,
corre-se o risco de repetir investimentos em comunidades, perdendo, assim,
energia e recursos. Como exemplo, imagino uma empresa conhecendo a necessidade
de uma comunidade de seu interesse, venha a investir na construção de uma creche.
Outra empresa, com o mesmo interesse, mas sem conhecer os demais projetos em
curso, pode vir a construir uma segunda creche, deixando outras necessidades
sem investimento naquela comunidade. Juntas, poderiam construir uma só creche
mais ampla ou com mais recursos ou ainda construir uma creche e uma quadra
esportiva.
Outra questão fundamental, no meu
entendimento: o alinhamento das ações socioambientais com a missão empresarial:
nem sempre isso ocorre.
As ações socioambientais surgem,
muitas vezes, a partir de ações voluntárias e informais dentro das empresas.
Não podemos, entretanto, deixar
de observar que:
- Ações robustas dependem de
investimentos e, portanto, precisam de aprovação da diretoria;
- Muitas vezes a questão da
imagem institucional é usada como justificativa para as ações socioambientais,
mas, estando essas ações alinhadas com a missão empresarial, as chances de
obtenção de recursos se torna mais viável;
- Ações socioambientais
alinhadas com a missão e estratégia da empresa podem trazer resultados no
aumento de faturamento ou eliminação de perdas comerciais, como exemplos: “criação
de um produto mais barato para mercados de menor renda”, “investir em projetos
de geração de renda para que o mercado tenha maior capacidade de compra”, “investir
em cursos que possam gerar maior conhecimento sobre a marca, através do uso do
produto ou serviço” etc.
- Dissociar as questões
ambientais das necessidades sociais envolvidas pode resultar em agravamento dos
cenários e promover a exclusão social, quando seria possível que propostas
socioambientais trouxessem renda para as famílias dentro de atividades
ambientalmente sustentáveis. Exemplos disso existem muitos, como o caso das
queimadas realizadas por produtores rurais que não conseguem encontrar
vantagens econômicas na preservação do meio ambiente pois, sem um projeto robusto,
acabariam por perder sua principal fonte de sustento.
Em resumo, seria interessante um
movimento de pesquisa de mercados alinhados com suas necessidades
socioambientais cujos resultados pudessem ser compartilhados entre as empresas,
para que pudessem se aliar no investimento e potencializar seus resultados.
Nesse cenário, o papel dos grupos
de ODS é de fundamental importância.
Curioso perceber, em minha
experiência profissional, que as empresas são movidas a ações socioambientais
a partir de três principais motivos:
- Legislação: leis socioambientais
que exigem investimentos responsáveis e contrapartida social;
- Empréstimos internacionais:
bancos mundiais que oferecem financiamento com contrapartida socioambiental;
- Exportação: países que
exigem responsabilidade socioambiental para entrada em seus mercados nacionais.
Existem outros mecanismos, como
por exemplo a venda de “créditos de carbono”, cujo interesse começa a aumentar
no meio empresarial.
Nesse contexto, as empresas
privadas têm muitas vezes maior interesse em ações socioambientais do que
muitas empresas públicas, o que parece ser um paradoxo, mas, se explica por razão
da legislação engessada que pesa sobre a gestão pública.
Vivemos num modelo econômico em que
o lucro é o motivador de todas as ações empresariais e penso ser ingênuo
pensar que empresas investem em ações socioambientais por razões altruístas.
Que seja então por força de legislação,
exigências de bancos internacionais ou imposições para ingresso em mercados em alguns
países.
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